Futebol, religião e política: senso comum e bom senso

João Flávio Resende - Colunista Folha de Brumadinho João Flávio Resende tem 49 anos, é formado em jornalismo pela PUC Minas, especialista em Gestão Pública pela UFJF - Universidade Federal de Juiz de Fora. Foi professor na Escola Estadual Paulina Aluotto Ferreira, na Escola Estadual de Mário Campos e no CEFET-MG. Em Brumadinho, colaborou com a Rádio Inter FM e também com os jornais De Fato e Brumadinho em Foco.

Opinião

Por João Flávio Resende

O título deste artigo menciona três aspectos da nossa vida que, dizem, não deveriam ser discutidos, que cada um tem sua preferência, enfim, esses pensamentos rasos do chamado “senso comum”. Particularmente, acho o tal do senso comum o que há de pior na nossa existência.

O senso comum é o responsável por inúmeras mazelas. É ele que diz que bom marido “ajuda” em casa, ao invés de dividir tarefas. Diz que cabelo de negro é ruim, que bandido tem que morrer, que criança tem que apanhar, que quando a mulher perde o bebê na gravidez não deve sentir tristeza porque logo vem outro, que mulher é ruim de volante.

É o maldito senso comum que levou o país para o buraco em que nos metemos todos. Você duvida? Eu te desafio a mostrar UMA coisa boa desse maldito governo, UMA ação efetiva voltada para melhorar a vida dos mais pobres, UM projeto de sustentabilidade ambiental.

Aí vem de novo o tal do senso comum, dizer na minha orelha que futebol, religião e política não se discutem. Vamos ver se não mesmo.

Abaixo, seguem definições de cada um dos temas (de acordo com a Oxford Languages) e minhas considerações a respeito.

FUTEBOL: “esporte, cujas partidas são disputadas por duas equipes de 11 jogadores, em que é proibido (exceto aos goleiros, quando dentro da sua área) o uso dos braços e mãos, e cujo objetivo é fazer entrar uma bola no gol do adversário”. Paixão brasileira, o futebol é cercado de mitos, tabus, escritas, tem um dialeto próprio e, não raro, serve de pretexto para brigas entre grupos rivais. Particularmente gosto de ver, de jogar (embora não jogue há muito tempo e sempre tenha sido um perna-de-pau), gosto do caráter coletivo deste esporte.

Futebol, para mim, é entre o apito inicial e o final, dentro das quatro linhas. Fora disso, é zoeira, gozação, diversão. O máximo que podemos discutir são as técnicas utilizadas em cada time, características dos jogadores, desempenho dos clubes ao longo dos campeonatos, trabalho da arbitragem… Pronto, para por aí. Mais do que isso, é pura especulação, provocação. Resumindo: cada um com seu time, em diversão, em paz. E que vença quem vencer (nem sempre o melhor vence…).

Então, torcedores, vamos nos divertir e ponto.

RELIGIÃO: “crença na existência de um poder ou princípio superior, sobrenatural, do qual depende o destino do ser humano e ao qual se deve respeito e obediência”. Historicamente, a humanidade sempre buscou seres superiores para explicar a existência humana, os sabores e dissabores da vida. Eu sou cristão, de formação católica, simpatizante de algumas vertentes das religiões evangélicas e também do espiritismo. Pode parecer uma certa confusão, mas o Cristo é o mesmo, o Deus é o mesmo.

Acredito nas religiões e doutrinas como instrumentos de esclarecimento, de conexão com o Divino e, principalmente, de amor, de libertação, de perdão e de caridade. Acredito na plena liberdade do exercício de crença e também na liberdade de não crer. Cada um siga o caminho que lhe for melhor e, de preferência, não use a sua religião para julgar a dos outros, nem como instrumento de dominação, de opressão ou de subserviência. Afinal, já se matou e se morreu demais em nome de Deus.

Sempre lamento que alguns líderes e algumas instituições religiosas usem o nome de Deus para justificar arrogância, prepotência, para controlar a vida dos outros sob o temor de castigos e punições divinas, quando, na verdade, Deus é a maior expressão de amor. É um assunto que renderia inúmeros artigos, mas, em nome do espaço que aqui tenho, deixo o tema para reflexão do/a leitor/a.

Então, líderes religiosos, ajam certo, promovam o bem e os verdadeiros ensinamentos divinos. Não tratem as religiões como instrumentos de poder. Não sejam arrogantes. Coloquem-se na condição de tão humanos, falhos e pecadores como nós, pobres mortais. Assim, terão mais chance de aprender e, depois, de ensinar.

POLÍTICA: “arte ou ciência de governar”. A política é frequentemente confundida com outras coisas: com eleições, gincana, roubalheira, desmandos, joguinhos de poder e vaidade, corrupção, fraudes, mentiras (nos tempos que estamos vivendo então, nem se fala…). O poder deveria ser entendido como instrumento de serviço. Entretanto, ao invés de ganhar eleições para governar, muitas forças políticas governam para ganhar eleições. E, com isso, acabam perpetuando no poder uma forma de governar que oprime os mais pobres, coloca o Estado a serviço de quem tem dinheiro, distribui mal a riqueza gerada, não cuida de quem deveria ser cuidado, não promove o bem-estar geral.

Para piorar a situação, o Brasil está vivendo hoje uma crise sem precedentes: crise econômica misturada com crise sanitária e irresponsabilidade total do governo federal quanto às duas calamidades. Parece implicância minha, né? Então, observe com atenção como os que detêm o poder estão lidando com tudo isso. Quem está dialogando com a sociedade para buscar saídas para conter o coronavírus? Quem está realizando forças-tarefa para minimizar os impactos da pandemia? Quem está trabalhando arduamente para promover a saúde coletiva e possibilitar a retomada da plena atividade econômica? Quem está se movimentando para aplacar a fome, a miséria e o desemprego que assola mais de 25 milhões de brasileiros atualmente? Quem está dando algum tipo de assistência às famílias dos mais de 450 mil mortos pela Covid (número atingido no dia em que escrevo este texto)? O que quero saber é o seguinte: o que os detentores do poder estão fazendo HOJE para melhorar a vida das pessoas?

Então, política se discute, sim! Sabe por quê?

Porque a sua escolha impacta diretamente a minha vida e a vida sobretudo dos mais pobres, dos que mais dependem do Estado. E discussão política, para mim, vai muito além de nomes. Envolve projetos, ideologia, conceitos mais profundos, teorias, e, principalmente, o senso de coisa pública, de coisa coletiva. Quem me conhece sabe que sempre vi na atividade política um meio para melhorar a qualidade de vida das pessoas. E, para mim, qualquer coisa que vá na contramão disso está errada, não importa a bandeira que levantem.

Geralmente, tenho muita preguiça de campanhas eleitorais. Ao invés de ser momentos de intenso diálogo com a sociedade, viram ringue de luta, de profusão de mentiras, de desinformação, de partidos e candidatos se matando para colocar a mão naquilo que me pertence, que pertence a você, a todos nós. Ora, se vão cuidar do que é nosso, se em tese vão trabalhar para a gente, não deveriam se organizar em panelinhas cheias de vampiros, não é mesmo?

Então, políticos, cumpram suas obrigações para conosco. Mintam menos e trabalhem mais.