Atingidos se mobilizam contra “acordão” entre governador e Vale

Movimentos prometem recorrer ao STF, se os atingidos não forem ouvidos sobre as medidas de reparação

A assinatura do acordão bilionário entre o governo de Minas e Vale na última quinta-feira, dia 4 de fevereiro, causou revolta entre os atingidos pelo rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão, em 25 de janeiro de 2019, que causou a morte de 272 pessoas.

Os atingidos alegam que em momento algum foram ouvidos e tão pouco consultados, sendo totalmente excluídos de qualquer negociação a cerca das reparações. Eles acusam o governo de Minas em aproveitar a tragédia para realizar obras com o dinheiro, entre elas, o polêmico Rodoanel, que segundo as frentes populares, irá beneficiar diretamente a mineração, principalmente se o governo insistir com o trajeto passando dentro de Brumadinho.

A negociação, que NÃO TEVE A PARTICIPAÇÃO DOS ATINGIDOS, durou mais de 4 meses. A Vale vai pagar R$ 37,68 bilhões, valor que, segundo o governo de Minas, é o maior acordo já realizado na história do Brasil. A proposta colocada inicialmente pelo Estado, era de R$ 55 bilhões.

Nota de repúdio das comissões dos Atingidos e Atingidas de toda a Bacia do Paraopeba reconhecidas pelas instituições de Justiça, ONGs, movimentos sociais e apoiadores. Assinam esse documento, 59 entidades, totalizando 159 assinaturas também com pessoas físicas.

Nota do movimento “EU LUTO BRUMADINHO VIVE”

Nota de repúdio ao acordo Vale e
Governo do Estado de Minas Gerais

O “Eu Luto, Brumadinho Vive!” vem a público se manifestar contra o acordo fechado na manhã desta quinta-feira, 04 de fevereiro de 2021, entre o Governo do Estado de Minas Gerais e a mineradora Vale, no Tribunal de Justiça do Estado.

Repudiamos o acordo pela forma como foi conduzido, pelos resultados obtidos e pelas consequências nefastas que gerará. Há uma série de questões não consideradas e outras que podem contribuir para o agravamento do cenário de violação de direitos, abandono, impunidade, não reparação ambiental e desumanização instalado em Brumadinho e outras cidades afetadas após o crime que retirou a vida de 272 pessoas, 11 delas ainda não encontradas.

Descrevemos abaixo nossas considerações e objeções:

a) o acordo não conta com a participação dos atingidos de Brumadinho e das outras cidades afetadas pela lama;

b) toda a ação orquestrada antes pelo Ministério Público e pela contratação de consultoria técnica cai por terra com esse acordo a portas fechadas;

c) representações eleitas pelo povo de Brumadinho e demais cidades afetadas (vereadores, prefeito) e organizadas pelas comunidades (associações, movimentos), legítimos representantes do povo, não participaram do acordo;

d) Brumadinho e as demais cidades afetadas pelo crime precisam de investimentos em políticas públicas de saúde, educação e desenvolvimento sem mineração;

e) os investimentos de reparação, para trazerem impacto positivo para Brumadinho e outros municípios, devem ser usados no fortalecimento de políticas públicas locais, libertar esses territórios da dependência da mineração e fazer desses locais exemplos de geração de tecnologias e empreendimentos de bioeconomia, serviços ambientais, economia circular e sustentabilidade;

f) a construção de um Rodoanel, com recursos do acordo, desvia o dinheiro de sua finalidade, a reparação para reconstrução dos territórios com fins de aprimorar a qualidade de vida dos que vivem lá;

g) um Rodoanel interessa mais à mineração, para escoar sua produção, do que ao município de Brumadinho, que pouco ou nada ganhará com esse modal e ainda vivenciará problemas sociais graves quando as comunidades se tornarem beira de rodovia;

h) um Rodoanel passando pelo Parque do Rola Moça é um grave ataque ao patrimônio natural dessa importante reserva de Brumadinho, alvo da cobiça de grupos mineradores e região que também garante a estabilidade hídrica para abastecimento da RMBH;

j) a construção de um Rodoanel reforça o “Carro Centrismo” e ataca os princípios de uma mobilidade urbana cidadã, inclusiva, segura e baseada na sustentabilidade, reforçando a inadequação da utilização de verbas de passivo e crime ambiental para tal obra. A RMBH precisa de uma mobilidade urbana baseada na integração de vários modais, na recuperação do papel das ferrovias no transporte metropolitano, na construção de vias amigáveis aos pedestres e aos ciclistas e na superação do transporte rodoviário como centro dos transportes e mobilidade, tudo o que o Rodoanel não representa.

Esse acordo é um desserviço à Brumadinho e todos os territórios afetados pelo crime da mineradora Vale em 25 de janeiro de 2019. É um ultraje, porque usa dinheiro manchado pelo sangue das joias/vidas perdidas para obras que não vão impactar positivamente os municípios e ainda vão favorecer a própria corporação criminosa no escoamento de sua produção mineral.

NOTA | MAB IRÁ RECORRER AO STF, APÓS ACORDO ENTRE VALE E GOVERNO DE MG SOBRE BRUMADINHO

Movimento não aceita valores rebaixados, falta de participação nas negociações e estuda entrar com recurso no Supremo para garantir reparação integral aos atingidos da bacia do rio Paraopebapor Movimento dos Atingidos por Barragens

Publicado 04/02/2021 – Atualizado 04/02/2021

Na manhã desta quinta-feira (4), no TJMG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais), foi assinado o acordo global entre a mineradora Vale e Estado de Minas Gerais referente ao crime do rompimento da barragem em Brumadinho, que completou dois anos neste mês.

Foto: Nádia Nicolau / Mídia Ninja

O governador Romeu Zema (Partido Novo), de maneira mentirosa, afirmou que “todas as partes envolvidas participaram” e que esta foi “uma participação como poucas vezes se viu em Minas Gerais”. 

Desde outubro de 2020, o acordo é construído sem nenhuma participação dos atingidos, representantes ou comissões na mesa de negociação. Apenas em uma das reuniões, os atingidos foram convidados a estarem presentes na sala e apenas como ouvintes, sem direito a fala, representando uma ideia falsa de participação no acordo. E os atingidos não aceitaram.

Este é o acordo dos “de cima”, envolvendo a criminosa e quem deveria fiscalizar, impedir e punir o crime.

Além da falta de participação, o acordo seguiu diversas práticas inconstitucionais, colocando sigilo sob as resoluções do acordo e violando as práticas de publicidade e transparência do processo.

Ao final das negociações, os atingidos foram golpeados com a transferência dos processos judiciais, que tramitavam em 1ª instância na 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte, conduzidos pelo juiz Elton Pupo Nogueira, para a 2ª instância, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) do TJMG. Uma conduta que representa uma aberração jurídica.

Nesta quinta-feira, o que foi firmado entre as Instituições de Justiça, o Estado de Minas Gerais e a mineradora Vale S.A, é um acordo para a realização de obras para o governo do estado, apenas com uma pequena parcela de benefícios para os atingidos da bacia do rio Paraopeba, que são as vítimas e sofrem até hoje as consequências do crime.

Portanto, o Movimento dos Atingidos por Barragens ressalta que o acordo que garantiria a reparação econômica, social e ambiental dos danos morais coletivos e dos prejuízos econômicos causados ao Estado, provocados pelo rompimento da barragem da Vale, mina Córrego do Feijão, não foi feito.

Este é, em suma, um grande negócio entre a mineradora criminosa e o governo liberal de Zema, que buscam, juntos, a publicização de valores bilionários, com verniz de reparação, mas que na prática representam propaganda eleitoral e indicativo de boas condutas para o aumento das ações internacionais da mineradora.

Fica claro nas contas apresentadas que o Estado alcançou se objetivos de receber quase 27 bilhões, em troca apenas de 9 bilhões aos atingidos, descontando inclusive o pagamento emergencial ja feito nesses dois anos, o que é um absurdo.

Isso mostra claramente a intenção da proibição da participação dos atingidos nos processos de negociação, porque foram eles que sairam prejudicados com essa negociação, o que representa uma violação clara aos direitos básicos da população da bacia do rio Paraopeba, que ficou destruído após o crime.

É inaceitável que a reparação coletiva dos danos causados pelo maior crime trabalhista da história do país sejam direcionados para obras na capital, Belo Horizonte, e não para aqueles que foram soterrados ou que ainda hoje, dois anos após o crime, estão sem acesso à água potável, direito humano básico.

Ressaltamos ainda que os danos causados ao longo da bacia do rio Paraopeba são inúmeros, desde danos morais, psicológicos e da saúde do povo, até a falta de água, renda e lazer. Existem centenas de áreas que precisam ser reparadas.

A destinação de parte desse dinheiro para a continuidade do auxilio emergencial por um período de quatro anos é uma conquista, fruto das muitas lutas dos atingidos, mas é completamente pontual e insuficiente para a reparação da vida dos atingidos.

Para a justa reparação, será necessária uma outra construção, diferente deste acordo firmado entre criminosa e o Estado, onde seja definido, de fato, um plano de reparação com a ampla participação com capacidade de decisão dos atingidos.

Seguiremos em luta para que o acordo seja anulado. O MAB agora seguirá em estudo para recorrer no Supremo Tribunal Federal (STF) buscando a anulação dessa que é uma grande sacanagem com o povo atingido de Minas Gerais.