Mulheres bordam suas histórias em meio ao luto

As bordadeiras fazem parte do projeto ‘Semeando Esperança’, uma iniciativa da Fundação Vale

O rompimento da barragem da Vale, na mina Córrego do Feião trouxe uma dor imensurável para centenas de famílias de Brumadinho. Em meio a tristeza, com linhas, agulhas e memórias, 47 mulheres de famílias das vítimas da tragédia vêm bordando suas histórias e seu luto pela perda de entes queridos. Elas fazem parte do Semeando Esperança, projeto da Vale que ajuda familiares de vítimas a ressignificarem sua dor por meio de conversas e técnicas de bordado livre desde agosto de 2019.

 O Semeando Esperança é uma iniciativa da Fundação Vale, realizada em parceria com a Diretoria de Reparação e Desenvolvimento da Vale e com o Instituto de Promoção Cultural Antônia Dumont (ICAD). O projeto utiliza a metodologia A(bordar) o Ser, desenvolvida há 30 anos pelo Grupo Matizes Dumont. “Já rodamos todo o Brasil trabalhando o bordado como fonte de renda e emprego, mas também como ferramenta para o pertencimento social e a criação de laços comunitários”, conta Sávia Dumont, integrante do Grupo Matizes Dumont, fundadora do ICAD e coordenadora do projeto.

Ela explica que, em 2019, a metodologia foi adaptada para o contexto de Brumadinho. “Nas oficinas, valorizamos as trocas e vivências entre as participantes que perderam entes queridos. Por terem passado por dificuldades parecidas, elas se fortalecem e juntas constroem um mesmo caminho. A dor nunca vai acabar, mas passa a ser observada de outra maneira”

Aluna da segunda turma do Semeando Esperança, iniciada em março deste ano, a professora Andrea Olinda conta que entrou para o projeto para se aproximar de sua mãe. “Minha mãe já participava e foi muito bom pra ela, então quis entrar também. Está sendo ótimo, assim posso ajudá-la a bordar e ela a mim”, explica. Andrea revela que o processo tem proporcionado um importante momento de conexão entre as duas. “Bordamos juntas nossa vida, nossa infância, lembrando os momentos bons e os difíceis, mas que nos fizeram quem somos hoje. É muito prazeroso sentar com minha mãe para bordarmos”, relata.


Andrea Olinda e sua mãe participam juntas do Semeando Esperança.

Em seu primeiro ano, o projeto contou com a participação de 44 mulheres. Assim que começaram os encontros, cada uma bordou sua história de vida em uma mandala. Os frutos desse trabalho foram reunidos em uma exposição na Estação Conhecimento, em Brumadinho, intitulada “Histórias do Vivido”. Ronilda Teixeira, que continua frequentando o curso, lembra da exposição como um momento importante de sua vida. “Me senti uma artista. Não sabia que poderia me sentir tão importante. Todo esse processo nos deu muito estímulo para seguir”, conta.

Com o início da pandemia, as aulas foram adaptadas para o formato virtual. Das 44 integrantes da primeira turma, 35 continuaram no projeto. Outras 12 chegaram em março deste ano, quando foi aberta a segunda turma. “Mesmo com os desafios impostos pela pandemia, o projeto continuou crescendo. Isso mostra sua importância e seu valor para os envolvidos. O Semeando Esperança reafirma nosso compromisso com a reparação integral e o bem-estar dessas pessoas”, explica a gerente de Reparação Social da Vale, Bernadete Almeida. Em agosto próximo, o público será ampliado mais uma vez. No novo grupo poderá participar qualquer pessoa residente em Brumadinho. “Até o fim do ano, estão previstas mais duas turmas. Nossa expectativa é terminar 2021 apoiando 140 pessoas”, conclui.

Ciclos, temas e suportes para o bordado

O Semeando Esperança foi estruturado para que as turmas possam avançar com o passar do tempo, aprendendo novas e mais complexas técnicas de bordado ao mesmo tempo em que fortalecem laços sociais e ressignificam sua dor e seu luto. Para isso, o curso é dividido em ciclos, para cada um deles são escolhidos um tema e um tipo de suporte para o bordado.

Fotos: Reprodução/Vale